Há mar e mar, há ir e voltar!

por RETRY CD

Há mar e mar, há ir e voltar!

Há mar e mar, há ir e voltar!

Sentada na toalha, à beira mar, observo em silêncio pessoas desfilando nos estrados de madeira, que os levam ao areal quente, macio, em que afundamos os nossos pés desejosos da água transparente em tons de azul até o verde, fresca e revigorante.

Cores que nos fazem percorrer todos os tons da paleta, como se de inúmeras pinturas se tratassem: amarelos, laranjas, brancos e pretos, rosas, azuis, verdes, vermelhos, azuis, roxos, lilases… nenhuma das cores e tons ficaram esquecidas nas lojas, cada uma ao gosto de quem as veste.

O mesmo podemos dizer dos feitios e formas: bikinis, trikinis, fatos de banho, calções de banho, em corpos esguios, roliços ou mesmo gordinhos, mas todos com o direito ao sol e aquela água salgada incomparável.

Engraçado é, que nesta profusão de cores e feitios prolifera também a boa disposição: os sorrisos e risos soltos no ar quente, as conversas fluidas em tons animados, em todas as línguas, os movimentos de ternura trocados com maior frequência entre casais, pais e filhos, em que se nota relevantemente, a ausência do stresse e das corridas do dia-a-dia, que vão destruindo, ocupando imenso espaço ao usufruir espontaneamente da vida.

Naquele areal imenso, todas as pessoas usufruem da natureza de igual modo, contudo, como fora dali, mantêm-se algumas diferenças: existem os que povoam as espreguiçadeiras debaixo dos guardas sois de colmo e os que simplesmente se deitam nas suas toalhas, mais junto à orla do mar. Há uma corda branca no chão que separa o espaço em que cada um desses habitantes pode permanecer.

É assinalada também com uma corda perpendicular ao mar, a zona de guarda sois – parecendo minúsculas casinhas de telhados coloridos - que concedem a sombra necessária para as longas horas de permanência, quer dos seus habitantes, quer das pequenas ou enormes lancheiras, conforme o número dos familiares e/ou amigos de cada grupo de veraneantes.

Continuam a existir as pessoas que religiosamente respeitam as horas saudáveis de exposição solar, chegando cedo e partindo junto ao meio-dia ou mesmo antes e regressando a partir do meio para o fim da tarde, em oposição aos que continuam a chegar tarde e a más horas, não se escusando a transportar consigo as suas crianças das mais variadas idades, algumas delas ainda bébés.

De manhã cedo, chegam grupos de crianças de idade pré e escolar, inseridas em colónias de férias cujas vozes despertam o areal num papaguear animadamente ritmado, vertendo entusiasmo na sua paciente e organizada ida ao mar, sob a supervisão dos seus monitores, e dos salva-vidas que se mantêm mais atentos.

Tanta cor, tanto movimento, tanta harmonia que esquecemos completamente os momentos menos afortunados da vida, em prole de um conforto e bem-estar de alma, que vem reforçar o desfilar de lindas indumentárias de praia, envolvendo corpos de todas as formas e idades, como sempre deveria acontecer.

Chegamos então ao mar: deliciosamente tranquilo, transparente, fresco, mas mesmo assim, sempre indomável no seu querer e desejo misterioso. Mediante esta tentação levantei-me para mais um banho delicioso, partilhado por uma das minhas amigas de sempre e espero que para sempre. Mar dentro, mergulhando, balançando à tona da água e conversando no meio das nossas prazerosas habilidades marítimas, numa água que eu, friorenta como sou, estava a achar divinal. Contudo, a dada altura, fui tomando consciência de que estava numa certa luta ritmada com aquela água tao bonita e desejável e comecei a pensar que alguma coisa não estava certa. Também reparei que a água que de início se mantinha nos ombros, já estava 
à altura da minha boca, impedindo-me quase de falar, para o que ia dando pequenos saltinhos. Apelei à minha amiga que fossemos regressando 
para a borda de água e começámos esse intuito, mas sem grande resultado, percebendo então que não estava a conseguir sair do lugar, apesar de algumas braçadas. Fui empurrada nesse sentido, pela minha parceira de banho, numa generosa e altruísta tentativa de salvamento, mas sentindo-se mal da sua respiração e estando já as duas mais próximas dos banhistas, comecei a solicitar que me puxassem, esticando os braços alegando que estava muito cansada e dado que os salva vidas de nada deram conta, apesar da tentativa efetuada. Uma alma humana, depois de verificar a seriedade do meu pedido, puxou-me pelo pulso, e pediu a outra alma humana que estava consigo, que me puxasse pelo outro, trazendo-me a salvo para local com pé, o que muito lhe agradeci e podendo sair com tranquilidade, depois de ver que a minha amiga se encontrava já a salvo, embora sem ajuda. Não esquecerei mais, essa senhora de corpo intensamente bronzeado, a quem estou infinitamente reconhecida pela sua humanidade, habitando a mesma, esse espaço das espreguiçadeiras, a que eu não pertenço, na conceção de quem paga ou não paga os apoios de praia.

Ora umas horas mais tarde, soubemos por um dos salva vidas – o único que não parava na sua vigia continua, para uma praia imensa- que nessa mesma tarde já fora buscar a esse local um senhor que se deparou com a nossa dificuldade e que, na verdade, se tratava da existência de um agueiro, que decidiu estabelecer-se nesse local, neste verão, nessas esplendorosas águas que nada faz supor a sua existência.

Tendo essa informação, teria que a partilhar com a minha salva vidas, no sentido de lhe explicar que afinal a razão do meu cansaço tinha a ver com esse mesmo fenómeno e não apenas com a minha eventual diminuta resistência física. Dirigi-me à senhora em questão, entrando nessa área assinalada, sendo que a mesma me olhou com um ar seco, quase questionando o “meu atrevimento” de me chegar junto de si, mesmo mantendo-me à distancia que a boa educação dita, partilhando a informação como forma de prevenção para os seus banhos e dos seus, incluindo algumas crianças, sendo que a dita senhora me despachou em dois tempos, sem um mero agradecimento mesmo que apenas educacional, fosse.

Mais tarde, continuando a minha discreta observação da minha salva vida, percebi que a senhora não necessitava dessa informação, pois apenas se banhava mesmo na orla do mar, não podendo portanto, ser importunada por nenhum agueiro. Ainda bem, fiquei mais descansada, ditando a minha gratidão, que merece mais uma vida, por me ter mantido a minha!

Bem, aqui está a eventual razão da corda branca a separar as duas zonas: uns numa afirmação pela imagem através de uma eventual superioridade económica, outros, pela simplicidade da educação, cidadania e reconhecimento pelos outros. Mas, contudo, ainda bem que esta senhora habita esse lado da corda, logo acima do modesto retângulo de areia, onde poiso a minha toalha repleta de histórias para contar, dados os anos que me acompanha; que a visualizei e apreciei nas suas bonitas e cuidadas indumentárias de verão, pois permitiu-me naquele momento estabelecer uma identidade que libertasse o meu pedido de ajuda, da minha garganta tímida e cansada daquela luta, dirigindo-o a si e ficarei eternamente agradecida pelo seu gesto, que sem o saber, foi nobre e não, um simples gesto de imagem como certamente o concebe.

Acima de tudo, esta partilha diz-nos a todos, que o mar possui sempre o seu lado irreverente e que pela sua génese, mesmo nos maiores momentos de calmia, não deixa de nos dizer que não é, nunca foi e nunca será domado pelo homem, quer seja o que se regozija da sua existência tanto do lado de cima, como do lado de baixo, como perpendicularmente à corda branca, caída sobre a areia luzidia.

Tenham umas ótimas férias, usem e abusem das cores, das poderosas indumentárias de verão, façam-se notar mas sempre de forma elegante, juntando sempre o vosso lado humanitário e generoso, para com os outros e a vida, ficando incomparavelmente mais belos (as). Mas, lembrem-se que, lá diz o velho ditado: “ Há mar e mar, há ir e voltar! “.

Matilde Proença


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